Um mutirão da Defensoria Pública da Bahia (DPE/BA), em Vitória da Conquista, deu o pontapé inicial para uma atuação inédita pelo reconhecimento da identidade religiosa nos registros civis. A ação aconteceu na segunda-feira, 08, na sede da instituição, e atendeu adeptos de religiões de matriz africana interessados em incluir o nome de santo nos documentos. O procedimento é uma forma de registrar a ancestralidade e pertencimento religioso nos registros oficiais.
As pessoas iniciadas no Candomblé recebem um nome africano, comumente chamado de nome de santo ou nome do orixá, durante o processo de iniciação, também conhecido como feitura de santo. Além desses nomes, os atendimentos realizados pela DPE/BA buscam garantir a inclusão de nomes de orixás e de cargos dentro dos terreiros, como ogã e eked’.
De acordo com a coordenadora da 2ª Regional, Ana Luiza Brito, além de valorizar a cultura, a iniciativa contribui para combater o racismo e o preconceito aos quais os adeptos das religiões de matriz africana estão sujeitos diariamente. “O nome é uma expressão quase que imediata da nossa identidade. Fazer essa alteração é valorizar a identidade religiosa das pessoas que expressam uma fé que foi marginalizada em nossa sociedade”, explicou.
A nova Lei de Registros Públicos, Lei nº 14.382/2022, possibilita a alteração de nomes e sobrenomes diretamente nos cartórios de registros civis. No entanto, o custo para realização do procedimento chega a custar R$500,00. Com o mutirão realizado na segunda-feira, a DPE/BA vai buscar judicialmente a alteração gratuita do nome nos documentos das pessoas atendidas.
De acordo com o defensor público Walter Tarcha, a via de resolução judicial foi adotada após o cartório informar que não poderia fazer o procedimento gratuitamente e pela situação de vulnerabilidade socioeconômica das pessoas interessadas no procedimento. “Apesar de se tratar de um mutirão, cada caso será avaliado individualmente. A princípio, nossa previsão é de ajuizar uma ação para cada interessado”, explica o defensor público.
Durante o atendimento realizado na segunda-feira, além dos documentos necessários para a judicialização das demandas, as pessoas interessadas assinaram uma declaração que explicita como passarão a se chamar após a inclusão dos nomes de axé.
O mutirão foi construído em parceria com a Ya Rosa D’Oxum, ialorixá do terreiro Ilê Axé Alaketu Omi Ogbá. Ela soube que, em Camaçari, um líder religioso havia conseguido incluir o nome de santo no documento e levou a proposta de realização de um mutirão para a DPE/BA em Vitória da Conquista. Para a líder religiosa, a iniciativa busca resgatar os nomes perdidos no processo de escravização das pessoas trazidas do continente africano.
“Eu tenho meu nome de Axé, nome dos meus ancestrais, que me foi roubado. Poder falar que meu nome é Omijaré, que quer dizer água, e colocar ele nos documentos é uma questão de reparação. No processo de escravização foi roubada nossa identidade, mas eles não conseguiram tirar o meu sagrado”, afirmou.
Em Vitória da Conquista, a Defensoria Pública possui uma agenda própria para demandas de registros, que atende semanalmente os casos de alteração de nome e sobrenome, assim como casos de retificação (quando há erro no registro), suprimento (falta de registro) e registro tardio.
As pessoas interessadas em incluir o nome de santo nos documentos que não tenham sido atendidas no mutirão podem buscar o atendimento regular diretamente na unidade da DPE/BA em Vitória da Conquista, que fica no Loteamento Itamaraty, na Rua Rio Doce, nº 2294, Candeias.
