Quase 5 mil quilômetros separam a costa brasileira de Guiné-Bissau, país da África Ocidental que apresenta muitas semelhanças com o Brasil: ambos são banhados pelo oceano Atlântico, colonizados por Portugal e têm o português como língua oficial. Com pouco mais de 2 milhões de habitantes, Guiné-Bissau é considerado um dos países mais pobres do continente africano. De acordo com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), o país ocupa a 177ª posição no relatório do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH). Isso demonstra os enormes desafios que o país enfrenta para reduzir desigualdades, combater a pobreza e garantir os direitos de sua população.
Com esse foco, a Associação Nacional dos Defensores Públicos (ANADEP), o Conselho Nacional dos Defensores Públicos Gerais (CONDEGE) e representantes do Sistema das Nações Unidas em Guiné-Bissau assinaram, no dia 13 de novembro, um Termo de Referência para que a Defensoria Pública brasileira possa apoiar o país nas questões relacionadas ao sistema de justiça local. A assinatura ocorreu durante o XVI Congresso Nacional das Defensoras e Defensores Públicos (CONADEP), em São Luís.
De acordo com as diretrizes do documento, a colaboração estratégica envolverá o Ministério da Justiça e dos Direitos Humanos de Guiné-Bissau, as Defensorias Públicas Estaduais do Brasil, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH) no país africano. O objetivo central do termo é promover um acesso à justiça mais inclusivo e eficaz, especialmente voltado para mulheres e grupos em situação de vulnerabilidade.
A parceria foi iniciada no âmbito da Conferência Internacional “A Justiça e os Desafios Contemporâneos”, realizada em maio de 2024, com a participação da defensora pública do Estado de Minas Gerais, Mariana Carvalho de Paula de Lima. Durante o evento, Mariana compartilhou sua experiência sobre o acesso à justiça, apresentou as funções das Defensorias Públicas Estaduais e discutiu sua obra “7ª Onda de Acesso à Justiça – Acesso à Ordem Jurídica Justa Globalizada”. A conferência também resultou em propostas de linhas de atuação para a criação de um projeto conjunto, interligando as instituições participantes.
Para Mariana, essa experiência foi além de uma simples palestra. Ao observar de perto as necessidades locais e a realidade das comunidades, sentiu-se motivada a ir além das palavras e discursos. Ela buscou construir algo duradouro que realmente impactasse a vida das pessoas. Assim, em vez de apenas levantar questões, comprometeu-se a agir, o que culminou no Termo de Compromisso que formaliza esse desejo de transformação. "Este não é um compromisso apenas de palavras, mas de ações concretas que buscam trazer mudanças significativas e sustentáveis para a região", destacou a defensora.
Segundo Mariana, Guiné-Bissau enfrenta desafios significativos no fornecimento de serviços judiciais acessíveis, sendo que a população rural e grupos vulneráveis, como mulheres, frequentemente não têm acesso a mecanismos adequados de justiça. Para superar esses obstáculos, o Sistema das Nações Unidas busca apoiar o país, priorizando soluções centradas nas pessoas e fortalecendo a cooperação entre os atores nacionais e internacionais.
A presidenta da ANADEP, Rivana Ricarte, ressalta que a ENADEP será responsável por articular e coordenar as ações de capacitação para os profissionais que atuarão em Guiné-Bissau. “Queremos focar no desenvolvimento de habilidades essenciais, como mediação, conciliação e atuação extrajudicial, áreas que têm se mostrado fundamentais para garantir a inclusão e o respeito aos direitos das pessoas em situação de vulnerabilidade", afirmou.
Os objetivos do termo de referência incluem a troca de experiências e capacitação entre as Defensorias Públicas Estaduais do Brasil e os Centros de Acesso à Justiça (CAJ) de Guiné-Bissau, além do desenvolvimento de um projeto-piloto em regiões guineenses. A iniciativa também visa fortalecer a atuação extrajudicial, com foco em mediação e conciliação, capacitando tanto profissionais locais quanto lideranças tradicionais e religiosas. Um dos principais objetivos será adaptar o projeto "Defensoras Populares", das Defensorias Públicas Estaduais brasileiras, para a realidade sociocultural de Guiné-Bissau, capacitando mulheres para atuarem como defensoras de direitos em suas comunidades.
Participaram da assinatura a presidenta da ANADEP, Rivana Ricarte; a defensora pública de Minas Gerais e coordenadora da Comissão para Assuntos Internacionais da ANADEP, Mariana Lima; a defensora pública de Roraima, Geana Oliveira, representando o CONDEGE; e os representantes de Guiné-Bissau: o diretor-geral da Política de Justiça, Degol Mendes; o diretor do Gabinete de Informação e Consulta Jurídica, Pedro Manuel Gomes; a técnica de Assistência Jurídica do Centro de Acesso à Justiça, Nila Barbosa Crima; e o gestor de projetos do PNUD, Lucas Rocha.