Com demandas de saúde, segurança, estrutura e alimentação, os profissionais e os usuários do Centro de Atendimento Psicossocial (Caps) Novo Mundo, em Goiânia foram ouvidos no momento de Escuta Social realizado pela Defensoria Pública do Estado de Goiás (DPE-GO). O encontro, promovido pelo Núcleo Especializado de Direitos Humanos (NUDH), aconteceu na tarde da terça-feira (29/10) com a presença de representantes da sociedade civil.
Usuária do Caps Novo Mundo há três anos, Ynnae Uchoa Alves, de 29 anos, disse ser muito importante este momento de escuta. “É muito bom a Defensoria Pública vir aqui, porque nunca tivemos este ouvido aqui no Caps”, contou. “Eu espero que agora sejamos escutados, porque precisamos de muitas melhorias”.
Ynnae contou, ainda, que há seis meses não consegue receber o seu medicamento. “Só um dos remédios custa 80 reais e eu uso duas caixas por mês”, informou. “Eu uso outros dois remédios, que também não tem aqui. Neste último mês eu precisei fazer uma vaquinha para conseguir comprá-los, porque custou R$ 400. Quem faz tratamento aqui não tem essa condição de gastar R$ 400 por mês com remédio, em um medicamento que a Prefeitura de Goiânia deveria estar fornecendo”.
O coordenador do NUDH, defensor público Tairo Esperança, avaliou como muito importante a realização desta escuta. “Hoje, nós conseguimos ampliar o debate da Defensoria Pública com as pessoas em sofrimento mental, conseguimos aproximar a Instituição e conhecer um pouco da realidade do serviço oferecido no Caps”, explicou. “A DPE-GO tem a função de fiscalizar o Poder Público. Encaminharemos ofício e buscaremos melhorias para a população, que precisa tanto deste espaço”.
O evento é fruto de duas reuniões anteriores organizadas pela Ouvidoria-Geral da DPE-GO com movimentos sociais que atuam junto à Raps, em 23 de fevereiro e 12 de junho, e com a participação do Núcleo de Defensorias Especializadas em Saúde da Capital e do NUDH.
“A Escuta Social vem reforçar os documentos apresentados pelos movimentos sociais nestas reuniões, com violações de direitos, sucateamento das unidades, falta de equipamentos técnicos, ausência de medicamentos e a falta de equipe”, informou a ouvidora-geral Ângela Cristina. “É importantíssimo ver a Defensoria Pública realizando este processo de escuta, de humanização e de atuação estratégica de defesa dos direitos humanos dessas pessoas”.
Além do problema com a medicação, os participantes reclamaram da condição de segurança do Caps Novo Mundo. O local não possui segurança e seus muros são baixos. Funcionários relataram que equipamentos já foram roubados e duas usuárias narraram que pessoas já invadiram o local para tentar furtar pertences de quem estava utilizando os dormitórios do Centro.
Além disso, os quartos estão com janelas quebradas, tampadas apenas com isopores e papelão. Já na questão da alimentação, a maioria dos participantes reclamaram da qualidade da comida que chega na unidade.
Luta Antimanicomial
Apesar da Lei Antimanicomial (Lei 10.206) ser de 2001, Tairo Esperança disse que em Goiânia ela ainda não é aplicada, com instituições que ainda permanecem no modelo de manicômios. “Historicamente, as pessoas com problemas de saúde mental foram jogadas nessas instituições, como se trancá-las em manicômios fosse resolver os problemas de saúde mental”, contou. “Isso viola muitos direitos, como o de saúde, de alimentação, além dos diversos casos de tortura”.
O conselheiro local de saúde Glaucio Bianchetti ressaltou que o usuário do serviço de saúde mental precisa ser respeitado. “São anos e anos de luta e sempre são as mesmas demandas. O Caps Novo Mundo é o maior da região, passando de 2 mil prontuários ativos. Aos trancos e barrancos nós fazemos a Lei 10.206 ser minimamente respeitada”, protestou Glaucio Bianchetti.
Segundo Ângela Cristina, a saúde mental tem sido substituída pela política manicomial no município de Goiânia. “E o que as pessoas reivindicaram na Escuta Social é um tratamento em liberdade e humanizado”, disse a ouvidora-geral.
O coordenador do NUDH reforçou que a Rede de Atenção Psicossocial (Raps), formada pelos Caps e pelas Unidades Básicas de Saúde, deve ser fortalecida, para que o cuidado em saúde mental seja feito em liberdade, com dignidade e com tratamento adequado. “Essas pessoas devem ser tratadas com direitos e não simplesmente largadas em um espaço para que a sociedade siga esquecendo que elas existem”, afirmou.
Também compuseram a mesa de escuta a vice-presidente do Conselho Local de Saúde, Isabel Clímaco Matos, e a integrante da Associação de Usuários do Serviço de Saúde Mental (AUSSM) e usuária do Caps Negrão de Lima, Vanete Resende.