A Defensoria Pública do Estado do Paraná (DPE-PR) já atendeu quase 25 mil pessoas em unidades prisionais por meio da Central de Liberdades, programa que completou cinco anos em 2024. Ao longo deste período, a atuação resultou em 1.900 pedidos de liberdade e com 316 decisões favoráveis. O objetivo do programa é evitar a continuidade de prisões desnecessárias, principalmente, casos de pessoas presas preventivamente e em situação de vulnerabilidade jurídica e social. Os pedidos de liberdade podem resultar em medidas cautelares alternativas à prisão.
O trabalho inclui desde pedidos em primeiro grau até atuações no Supremo Tribunal Federal (STF). Nestes cinco anos, a Central de Liberdades também incorporou serviço socioassistencial, com atendimento técnico e contato com familiares das pessoas presas.
Os números constam em relatório do Núcleo de Política Criminal e Execução Penal (NUPEP). O documento também mapeou a presença do programa no Paraná: a Central de Liberdades alcançou 111 unidades do Poder Judiciário, quase 70% do total no estado. “O diagnóstico mostra a capilaridade do programa e a concretização de seu objetivo, que é atender a população carcerária mesmo em cidades onde não há presença de uma sede física da instituição”, afirma Luana Neves Alves, defensora pública e coordenadora do NUPEP. “Ao longo dos anos, a expansão do programa permitiu um trabalho cada vez mais forte na garantia de direitos da população carcerária, o que se refletiu também em uma significativa contribuição para a eficiência da política criminal no Paraná”, complementa ela.
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Hoje, a Central de Liberdades conta com seis equipes, sediadas em Curitiba, Foz do Iguaçu, Londrina, Maringá e Guaíra. O programa cresceu por meio de um convênio firmado entre a DPE-PR e o Ministério da Justiça e Segurança Pública. O acordo trouxe recursos federais para a iniciativa, que na época ainda não tinha caráter de programa permanente.
A partir do fim de 2023, com a entrada de novas equipes, a média de casos atendidos aumentou 56%. A estrutura atual possui defensores(as), assessores(as) jurídicos(as), assistentes jurídicos(as), assistentes sociais e estagiários(as).
Perfil
O relatório do NUPEP aponta que 44% dos pedidos de liberdade correspondem a casos em que há acusação de crimes sem violência - tráfico de drogas, furto e roubo. Esse tipo de caso é o foco de atuação da Central de Liberdades. O Código de Processo Penal (CPP) define que a privação de liberdade só pode ser aplicada para crimes sem violência quando for imprescindível para a continuidade do processo. Mas, na prática, a Defensoria Pública localiza centenas de pessoas acusadas desses crimes que, tecnicamente, não deveriam estar presas.
O programa identifica a mesma situação em análises processuais de réus ou rés primárias, quando não há condenação com trânsito em julgado. Mais da metade dos atendimentos (54%) correspondem a esses casos. De acordo com a lei, a Justiça deve privilegiar medidas cautelares alternativas à prisão também para pessoas primárias.
“A prisão nem sempre é a resposta”, destaca Isabela Tonon Furtado, assessora jurídica do NUPEP. “A prisão muitas vezes desumaniza as pessoas e as afasta ainda mais de uma vivência social saudável. Quando se faz isso com uma pessoa que sequer precisava estar presa o resultado é muito negativo para a sociedade como um todo”, explica ela. Furtado reforça que, nesse sentido, o papel da Central de Liberdades é também garantir os direitos de pessoas “esquecidas” dentro das prisões.
Minorias sociais
Grupos minorizados socialmente recebem atenção prioritária da Central de Liberdades. O NUPEP classifica situações de hipervulnerabilidade nos casos de pessoas gestantes, LBGTQIA+, indígenas, idosas e com sofrimento mental, por exemplo. Esses atendimentos obedecem também a critérios específicos, tanto no acolhimento das demandas quanto nos pedidos de liberdade.
Em relação a gestantes, o programa utiliza o entendimento do próprio CPP, reforçado pelo STF, que prevê a conversão de prisão preventiva em prisão domiciliar. A regra vale também para mães responsáveis por filhos de até 12 anos ou com deficiência.
Já na atuação em favor de pessoas indígenas presas, a Central de Liberdades reivindica os procedimentos especiais contidos na Resolução 287 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Eles determinam o respeito aos costumes e às tradições indígenas. Com base nesse entendimento, a Defensoria Pública pede que a pessoa responda a uma acusação criminal ou cumpra pena junto à sua comunidade, por exemplo, entre outras solicitações.
A assistente social Nara Damião dos Santos Lucena, que atua em Londrina, ressalta que, no caso de grupos minoritários, o suporte psicossocial e a defesa de políticas públicas dentro das unidades é essencial para combater as desigualdades sociais. Nos últimos cinco anos, por meio da Central de Liberdades, 277 pessoas presas receberam atendimento do serviço social. “Com uma perspectiva focada na promoção e defesa dos direitos humanos, nossa meta é assegurar que todos possam acessar serviços essenciais, como saúde, educação e assistência social, além de garantir, sobretudo, a liberdade”, afirma Lucena.