A agitação da estação Central do Brasil refletia a ansiedade das(os) 18 jovens que estavam ali aguardando para realizar o sonho de uma vida inteira: retificar seus documentos com o nome e o gênero com os quais se identificam. Na última quarta-feira (25), o 4º Núcleo de Tutela Coletiva da Defensoria Pública viabilizou a requalificação civil de 18 pessoas, em parceria com a Superintendência de Pessoas Desaparecidas e Documentação Básica do Estado do Rio de Janeiro e o Tribunal de Justiça do Rio.
A defensora pública Mariana Pauzeiro, do 4º Núcleo de Tutela Coletiva, explicou o surgimento da iniciativa:
— Alguns municípios têm comitês com o objetivo de erradicar o sub-registro, mas muitos desses comitês estão inativos ou com dificuldades para desenvolver suas atividades. O 4º Núcleo de Tutela Coletiva tem incentivado a retomada das reuniões dos comitês e auxiliado a desenvolver um fluxo de atendimentos. A pauta da requalificação surgiu em um de nossos encontros e, a partir de então, conseguimos trazer 18 pessoas de Duque de Caxias para atendimento pelo ônibus da Justiça Itinerante da Central do Brasil.
A estudante de Psicologia Safira Oliveira, de 28 anos, descobriu a campanha da Defensoria Pública por meio do Centro de Cidadania de Duque de Caxias e explicou o alívio, após receber apoio.
— Essa questão da documentação sempre foi algo que eu pesquisei, mas via como algo distante. Tudo é muito longe, e eu sou de Duque de Caxias. O direito também é nossa realidade, mas hoje em dia você ser travesti e procurar ajeitar a documentação é algo muito exaustivo psicologica, financeira e fisicamente — avaliou Safira.
A cada nome convocado pela Defensoria Pública, uma salva de palmas e sorrisos anunciavam que mais uma pessoa do grupo vindo da Baixada Fluminense estava prestes a receber uma sentença de retificação do nome a ser levada ao cartório, sem custo. A partir dela, o registro civil é corrigido gratuitamente, a começar pela certidão de nascimento.
Nathaniel Barreto, de 18 anos, também é caxiense e descobriu a ação por indicação de um amigo que também conseguiu a requalificação civil. O jovem comemorou a conquista do direito:
— Eu me identifico como homem trans desde a infância e sempre fui acolhido pelo meu pai. Hoje, consegui um dos meus maiores sonhos, que é requalificar o meu nome. Acho que, para qualquer pessoa da comunidade chegar aqui houve bastante luta. Estamos muito felizes com esse resultado.
Segundo a defensora Mariana Pauzeiro, o impacto da requalificação civil na vida de pessoas transexuais e travestis é imediato:
— A requalificação traz cidadania para a pessoa acessar seus direitos e ser tratada com dignidade. Isso impacta, por exemplo, na questão da empregabilidade, que costuma envolver muita vergonha e rejeição. Através da mudança de nome, a pessoa passa a ser tratada como ela realmente se autorreconhece, em vez de estar presa ao registro de nascimento.
Em outubro, a ação de requalificação civil da Defensoria Pública atenderá pessoas de Belford Roxo e Nova Iguaçu. Para consultar informações e acessar o serviço, basta procurar o Centro de Cidadania LGBTQIAPN+ do seu município ou o 4° Núcleo de Tutela Coletiva da Defensoria Pública pelo telefone 3658-9741.