ANADEP é uma das entidades convidada a participar de reunião do Ministério da Justiça destinada a debater soluções para os problemas do sistema carcerário
Estado: DF
A presidenta da ANADEP, Rivana Ricarte, participou, nessa terça-feira (26/3), de reunião organizada pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP). O encontro reuniu a Secretaria Nacional de Políticas Penais (Senappen/MJSP), o Conselho Nacional de Políticas Criminais Penitenciárias (CNPCP) e o Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas do Conselho Nacional de Justiça (DMF/CNJ).
O encontro teve o objetivo de discutir a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 347, medida emitida pelo Supremo Tribunal Federal (STF) para a elaboração de um plano de intervenção para resolver a situações ligadas ao sistema prisional, com diretrizes para reduzir a superlotação dos presídios, o número de presos provisórios e a permanência em regime mais severo ou por tempo superior ao da pena.
A Suprema Corte determinou que há um Estado de Coisas Inconstitucional no sistema carcerário brasileiro, responsável pela violação massiva de direitos fundamentais dos presos. Isso demanda a atuação cooperativa das diversas autoridades, instituições e comunidade para a construção de uma solução satisfatória, em um prazo de seis meses.
A decisão tem interesse social, tanto em relação à qualidade de vida dos detentos, quanto de reverter a criminalidade dentro dos presídios brasileiros.
O ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, afirmou que, apesar de o prazo ser desafiador, é possível colher bons resultados. “O Estado precisa reconquistar o espaço que perdeu para o crime organizado no sistema prisional. Então, temos aqui uma responsabilidade muito grande. Mas tenho certeza que chegaremos a um bom resultado”.
Lewandowski afirmou também que há resistências políticas e da própria sociedade que precisam ser contornadas. “No sentido de que o endurecimento da legislação penal e o endurecimento das condições carcerárias é que vão resolver o problema da criminalidade, das facções, milícias e do crime organizado, mas nós que somos técnicos e trabalhamos no setor sabemos que não é isso”, ressaltou.
Na ocasião, Rivana Ricarte pontuou a atuação da Associação Nacional na pauta e mencionou a participação da entidade na audiência pública promovida pelo STF, em julho de 2021, antes do julgamento da ação, quando apresentou diversos pontos que precisariam serem analisados para a superação do Estado de Coisas Inconstitucionais no sistema carcerário brasileiro. Ao refletir sobre o debate específico em torno do plano nacional de enfrentamento proposto pelo CNJ, a dirigente apontou que se trata de uma oportunidade aberta pelo Supremo para construção coletiva do que pode ser a refundação do sistema prisional brasileiro e reconheceu que o CNPCP tem papel relevante nesta discussão, mas chamou atenção para os retrocessos legislativos que estão em tramitação no Congresso Nacional que caminha em direção oposta ao que está sendo construído pelos Poderes Judiciário e Executivo.
A dirigente também trouxe o olhar da Defensoria Pública no âmbito da questão carcerária. “Defensoras e defensores públicos que atuam na área criminal têm muita experiência institucional perante o sistema penitenciário brasileiro desde a porta de entrada pelas audiências de custódia até a execução penal. Os profissionais são responsáveis por inspeções e atendimento in loco das presas e presos. Por isso, é necessário que o plano que está sendo construído conte com uma escuta sensível das demandas da Defensoria Pública, as quais envolvem a solução da superlotação prisional, a partir de uma ótica de preservação dos direitos humanos", disse no debate.
Senappen
O secretário Nacional de Políticas Penais, André Garcia, enxerga o trabalho como uma oportunidade para todos aqueles que atuam na execução penal do país, em especial, para o Governo Federal. “No final das contas, aponta para um problema histórico, que nós temos uma grande oportunidade, em função dessa decisão judicial, de apresentar soluções", afirmou.
Segundo Garcia, algumas medidas já estão desenhadas e outras precisam ser ampliadas e fortalecidas, como é o caso da audiência de Custódia. “Nesse sentido, precisa ser fortalecida nos estados e permitir também uma estrutura que dê condições para que juízes, promotores e defensores tomem suas decisões", ressaltou. De acordo com o secretário, a solução envolve não somente a questão do encarceramento, mas, também, os meios alternativos à prisão.
"Que se permita, por meio desse plano, um financiamento para que os estados acompanhem as decisões dos meios alternativos”, disse. Garcia também mencionou que a política nacional de atendimento ao egresso já existe, mas precisa de maior robustez. "Inclusive, para ampliar os escritórios sociais e fundos municipais que precisam de recursos, também, para acompanhar os egressos nos municípios. Muita coisa já está em curso. Outras, nós estamos avaliando como solução”, concluiu.
Servidores apresentados à decisão
A Secretaria Nacional de Políticas Penais (Senappen/MJSP) também apresentou a ADPF 347 aos servidores junto com as ações que estão em planejamento. O objetivo é promover a disseminação de informações sobre a atuação da Pasta para a construção do Plano Nacional voltado ao Enfrentamento ao Estado de Coisas Inconstitucional, em virtude da decisão do STF.
A diretora de Cidadania e Alternativas Penais da Senappen, Mayesse Parizi, defendeu que a construção do Plano Nacional tem premissa dialógica e participativa, que envolve vários órgãos e instituições. Desse modo, "não faria sentido a construção das ações impulsionadas pelo Grupo de Trabalho, sem o alinhamento necessário com o corpo de profissionais responsável pela gestão da política penal nacional. Muitos dos pontos da ADPF 347 tocam, direta ou indiretamente, a competência da Senappen. Devemos pensar um processo que garanta cada vez mais institucionalidade, envolvendo de forma ativa uma pluralidade de atores. Que essa discussão esteja abarcada pelas especificidades e múltiplos olhares", disse.
CNPCP
O presidente do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP/Senappen), Douglas de Melo, disse que a decisão do STF é vista como uma oportunidade para superar as violações de direitos humanos. “Aquilo que o STF declarou na ADPF 347 é algo que já é do nosso conhecimento há muito tempo. Criou-se uma oportunidade para que as instituições que receberam o encargo do STF juntem energias no âmbito federal. Estamos apresentando propostas para diminuir a superlotação carcerária. E com essa diminuição, o Estado de Coisas Inconstitucional deve ser superado”, salientou.
Consej
O presidente do Conselho Nacional dos Secretários de Estado da Justiça, Cidadania, Direitos Humanos e Administração Penitenciária (Consej), Marcus Rito, afirmou que as instituições envolvidas estão se alinhando para construir um plano nacional que seja replicado nos estados. “O Consej tem como papel trazer as demandas e necessidades dos executivos estaduais, responsáveis pela administração penitenciária. A ideia é que a gente caminhe sempre de mãos dadas para atingir o objetivo principal, que é minimizar, senão, eliminar os grandes problemas do sistema penitenciário do Brasil”, destacou.
CNJ
Durante o evento, o coordenador do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas do Conselho Nacional de Justiça (DMF/CNJ), Luís Lanfredi, reforçou que o sistema prisional não é somente o que tem dentro da prisão.
“Aquilo é só uma parte do todo. Precisamos colocar os problemas a partir de suas causas, sem maquiagem. Só ganhamos um sistema prisional melhor, quando se torna transparente, e que isso possa ser discutido por todos”, enfatizou. Lanfredi também afirmou que apesar de o tempo estipulado pelo Supremo ser curto, não é algo distante.
“Fomos obrigados a parar para refletir sobre o que pode mudar esse sistema. Algumas coisas são intuitivas, outras experimentamos na pele”, explicou. O juiz mencionou que deve-se ter um olhar apurado em relação à realidade disfuncional do sistema carcerário. “Devemos estruturar as ideias adequadamente, para que elas sejam estimadas do ponto de vista orçamentário, a partir da métrica de acompanhamento e execução. Que nós possamos edificar um sistema que tenha uma governança mais robusta, estruturada, com plano de carreira (para os policiais penais) mais adequado”, disse o juiz.