A Defensoria Pública de Mato Grosso reverteu no Tribunal de Justiça decisão de primeira instância que tirou o poder familiar de D. P. S. M. sobre sua filha adolescente, o que a impediu de cuidar e viver com a menina desde o início da ação, em 2016. A separação de ambas foi determinada após o Ministério Público (MP) denunciar a mãe por negligenciar relato da filha, sobre estupro, cometido pelo tio paterno.
A defensora pública da Infância e Adolescência, Maria Silvério, afirma que recorreu da decisão de primeira instância após verificar que D. M. tomou a decisão de não relatar o caso à Justiça, por medo de que o ex-marido pudesse culpá-la pelo fato. A filha do casal tinha 10 anos à época da história.
Maria informa que a menina contou à mãe que o tio, irmão do pai dela, havia tocado nela durante uma festa, numa chácara da família paterna, no final de 2015. A defensora explica que a violência não foi consumada. Diante do fato, a mãe se calou. O pai ficou sabendo da história sete meses depois e procurou o Conselho Tutelar, que levou o caso para o MP.
“Há mais de dois anos a mãe deixou de conviver na mesma casa com a filha e perdeu liminarmente o poder familiar sobre ela. A menina relata que sente muita falta e quer viver com a mãe. Desde a decisão, ela mora com o pai. Observamos, neste caso, que a mãe não contribuiu para o crime, não o estimulou e que a perda do poder pátrio, pela omissão, é uma penalidade muito grave e injusta. E assim, recorremos”, afirma a defensora.
Maria ainda alega que o artigo usado pelo MP para pedir a perda do poder familiar por parte da mãe foi o 1.638 do Código Civil, incisos II e III, que descrevem as seguintes práticas: deixar o filho em abandono e praticar atos contrários a moral e os bons costumes. Porém, a defensora alega que a mãe foi omissa, mas não abandonou a filha ou praticou os atos atentatórios contra a moral ou bons costumes.
Os argumentos foram acatados pelo relator da Segunda Câmara de Direito Privado, desembargador Sebastião de Moraes Filho, que afirma respeitar as razões de decidir da juíza de primeira instância, mas lembra que o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), no seu artigo 5º, usado para a decisão, também não se aplica à conduta da mãe.
E acrescenta: “o próprio estudo psicossocial com o qual o magistrado firmou convencimento não autorizava a procedência da lide. E pelo que constam nos autos, a situação aconteceu uma vez. Muito embora reprove a atitude da mãe, que mesmo sabendo da situação, permitiu o convívio da filha com o tio, entendo que ela se calou por medo do ex-marido”, descreve trecho da decisão.
O desembargador lembra ainda que a regra é que os filhos devem viver com os pais e que no caso concreto, a omissão da mãe em não denunciar o fato após conhecê-lo, não é motivo suficiente para que perca o poder de cuidar e de ser responsável pela filha.
“Perder o poder pátrio para esta mãe, indubitavelmente seria uma pena severa, que não é razoável e que é desproporcional. E pensando na menor, penso que o melhor para ela é voltar a viver com a mãe e os irmãos, em guarda compartilhada com o pai”.
Para a defensora, a decisão do TJ corrige um erro. “Temos muitos casos tristes aqui, em que os pais são os vilões de seus filhos por abandono, por não dedicar cuidados e outras situações nas quais a Justiça interfere para proteger a criança e o adolescente. Mas não é esse o caso dessa família. Neste caso, acredito que a segunda instância corrige um erro”, avalia.