Às 9h da manhã da sexta-feira (11) o termômetro em São Luís (MA) já marcava 28°. No entanto, a temperatura parecia bem mais alta nos intramuros do Complexo Penitenciário de Pedrinhas. O local foi escolhido para sediar a primeira edição do Curso de Capacitação – inspeção de estabelecimentos prisionais – que faz parte das atividades do Programa Defensoria no Cárcere, que tem por objetivo aprimorar e uniformizar a atuação da Defensoria Pública nos estabelecimentos prisionais em todo o país. A ideia é instrumentalizar o defensor público com ferramentas necessárias ao desempenho de sua função institucional e contribuir de forma efetiva na transformação da realidade do cárcere no Brasil. O curso contou com 80 inscritos.
Ao lado dos defensores púbicos estaduais e federais, o padre Valdir Silveira – coordenador nacional da Pastoral Carcérária – foi um dos primeiros a entrar no Complexo. A primeira visita foi ao Presídio São Luís I e II. Lá o cheiro forte e úmido já denunciava as condições dos apenados do sistema fechado. As celas do PSL I foram projetadas para dois presos e comportam no mínimo quatro. Ao perceber a presença dos defensores públicos, os reeducandos começaram a bater com canecas nas grades e a pedir condições melhores. O banho de sol era unânime. Alguns reclamavam que não saíam há uma semana. “É preciso olhar tudo com cuidado. Esse diálogo permite que entendamos melhor a rotina dessas pessoas. Imagina ficar trancado, sem o contato com o mundo externo e em condições precárias. É uma tensão constante que alavanca situações extremas de estresse”, pontuou o coordenador da pastoral carcerária. No local era possível observar a presença de insetos e fezes de ratos.
Já na unidade Penitenciária de Pedrinhas (CCPJ), onde ficam os presos do regime semiaberto, as reclamações eram ouvidas por todos os lados. Entre elas: a falta de água constante, o entupimento do esgoto e dos vasos sanitários, a falta de médicos e de remédios. Outros também afirmaram que não havia regularidade na busca para o trabalho externo, o que dificultava a remissão da pena.
Em 2014, Pedrinhas foi palco de uma das piores crises do sistema prisional do Maranhão. Quinze presos morreram e ao menos 105 fugiram. O Complexo é um conjunto de Unidades Prisionais, situado no bairro Pedrinhas, na cidade de São Luís (MA), que integra o Presídio feminino, Centro de Custódia de Presos de Justiça de Pedrinhas (CCPJ), Casa de Detenção (Cadet), Presídio São Luís I e II, Centro de Triagem e o Centro de Detenção Provisória de Pedrinhas (CDP). O local abriga pelo menos 2.500 pessoas. Homens usam uniforme laranja e mulheres a cor de rosa. Segundo informações da Secretaria de Justiça e Administração Penitenciária do Estado do Maranhão – SEJAP – a visita íntima é regulamentada e a cada vinte dias os detentos recebem um kit de higiene.
O curso: No inicio do evento foram apresentadas aos defensores as melhorias no sistema carcerário do Estado. A ouvidora da SEJAP, Odaíza Gadelha, falou sobre a redução de 75% no número de homicídios no Maranhão, de janeiro a novembro de 2015, em relação ao mesmo período de 2014. As obras de construção, ampliação e reforma de presídios que resultarão na abertura de mais de 1.800 novas vagas no sistema prisional até 2016, a inserção de mais de 1.200 apenados no mercado de trabalho, a construção da fábrica de blocos de concretos, além de outros significativos avanços que também foram destacados durante a atividade.
A ouvidora geral do DEPEN, Gabriel Peixoto, explicou o principal objetivo do curso aos defensores. Segundo ela, “é preciso trabalhar o empoderamento dos defensores públicos enquanto gestores e promotores de políticas públicas no sistema prisional.”
A.M.P, 43 anos, foi preso por roubo e já está no regime semiaberto. Ele foi um dos selecionados com outros 30 detentos para participar da roda de leitura com o jornalista Klester Cavalcanti e para assistir ao filme Orestes, do cineasta Rodrigo Siqueira. Para ele, saber que há pessoas que se preocupam com as pessoas que “puxam-cadeia” é importante. “Hoje tenho uma outra visão. Estou cumprindo minha pena, trabalho e estudo. Ao sair daqui terei outra vida. Essas atividades também são importantes porque nos faz refletir sobre o que queremos e sobre como a sociedade lá fora vê o preso”, disse.
J.O.S, 28 anos, está em Pedrinhas desde 2007. Segundo ele, já viveu na maioria dos prédio da penitenciária e já presenciou muitas rebeliões no local. “Viver em cadeia no Brasil não é fácil. São muitas lutas entre nós mesmos [os presos]. Aí vem o abandono da família. E quando estamos no (sistema)fechado somos tratados muito mal. Não tem colchão. Não tem remédio para todo mundo”, explicou.
Os defensores ficaram cerca de dez horas em Pedrinhas. Dentro das atividades estavam palestras para os defensores e os detentos; grafitagem nos muros da penitenciária com os apenados; roda de leitura, exibição de filmes, elaboração de relatório por parte dos defensores e também visita a cada uma das unidades do complexo.
O Programa: O Programa Defensoria no Cárcere é uma iniciativa do Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN/MJ), da Associação Nacional dos Defensores Públicos (ANADEP), da Associação Nacional dos Defensores Públicos Federais, do Colégio Nacional de Defensores Públicos-Gerais (CONDEGE) e da Defensoria Pública da União (DPU) e que tem como objetivo aprimorar e uniformizar a atuação da Instituição nos estabelecimentos prisionais em todo o país.
O programa tem três eixos de atuação: O atendimento às pessoas presas provisoriamente; o atendimento às pessoas presas ou internadas com execução penal provisória ou definitiva em curso; e a atuação nas inspeções em estabelecimentos penais. Os documentos irão padronizar a rotina de trabalho do defensor público e contribuir de forma eficaz e econômica à gestão do sistema carcerário, além disso vai ajudar na construção de políticas públicas na área.
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