A pedido da ANADEF jurista renomado faz um parecer sobre o regime jurídico da Defensoria Pública e ressalta sua independência dos poderes, autonomia funcional, administrativa e financeira.
A Associação Nacional dos Defensores Públicos Federais (Anadef) consultou o professor de Direito Constitucional da UERJ e pós-doutor pela Yale Law School, dr. Daniel Sarmento acerca de diversas questões relativas ao regime jurídico da Defensoria Pública da União, especialmente em razão da aprovação das Emendas Constitucionais 74/2013 e 80/2014. O documento foi entregue em uma reunião na tarde desta terça-feira (28), da qual estiveram presentes o Defensor Público-Chefe do Rio de Janeiro, Romeu César Ferreira Fontes; e os defensores públicos Thales Arcoverde Treiger e Óscar Giorgi Ribeiro Batista.
Em seu parecer, Sarmento destaca que a Defensoria Pública desempenha um papel vital, no cenário de uma sociedade tão desigual como a brasileira. “Assim, sem uma Defensoria Pública forte, bem estruturada, com recursos materiais e humanos adequados para o desempenho de sua missão constitucional, fica comprometido o gozo de todos os direitos fundamentais dos indivíduos e grupos hipossuficientes e vulneráveis”, afirma o jurista.
Para a presidente da Anadef, Michelle Leite, o parecer destaca que a estruturação adequada da defensoria é um direito fundamental do cidadão mais necessitado. “A aprovação das duas emendas fortalece a instituição, mas sua efetivação ainda enfrenta resistência, por isso nos apoiamos em fundamentos jurídicos para não prejudicar o processo de estruturação da Defensoria Pública e alcançarmos, definitivamente, todas as unidades jurisdicionais do país”, destaca a presidente.
Com um histórico que remonta à atuação de funcionários públicos chineses na dinastia Qin, no século II A.C., a figura do ombudsman foi disseminada e recriada em várias partes do mundo. Para Sarmento, as características institucionais e a missão constitucional da Defensoria Pública da União permitem o seu enquadramento como ombudsman. “O desempenho da função de ombudsman pela Defensoria está delimitado pelo escopo das suas finalidades institucionais, que se ligam especialmente à defesa de indivíduos e grupos hipossuficientes e vulneráveis”.
Além das características de ombudsman, a Defensoria tem atuação que não são franqueadas à advocacia, como as prerrogativas de intimação pessoal nos autos e de contagem em dobro dos prazos processuais, a possibilidade de requisição a autoridades públicas de documentos, perícias, vistorias e diligências, e a realização de inspeções nos estabelecimentos penais, com livre acesso a todas as dependências e à documentação dos presos e internos. Em suma, o papel institucional dos defensores públicos não corresponde ao exercício da advocacia, a Defensoria Pública tem várias outras funções, ligadas especialmente à garantia dos direitos humanos dos grupos vulneráveis.
Autonomia funcional, administrativa e financeira
O jurista destaca que a promulgação da EC nº 80/2014, além de apartar claramente a Defensoria Pública da advocacia, fortalece ainda mais a instituição ao explicitar em sede constitucional o seu caráter permanente, a sua ligação visceral com o regime democrático, o seu papel na defesa dos direitos humanos, a sua atuação extrajudicial e legitimidade para a defesa de direitos coletivos.
“Com tais emendas, objetivou-se robustecer a Defensoria Pública, assegurando-lhe verdadeira blindagem institucional perante os demais poderes, contra os quais ela tem, frequentemente, que pelejar em prol das camadas socialmente vulneráveis da população. Essa autonomia, diga-se de passagem, é essencial para o efetivo cumprimento da sua missão constitucional”, diz o documento.
De acordo com o parecer, a necessidade de autonomia financeira é reforçada pela EC nº 80/2014, que estabeleceu, o prazo de oito anos para a efetiva instalação da instituição em todas as seções judiciárias do país. “Para se dar cumprimento a esse importante comando constitucional, será essencial dotar a instituição com os recursos indispensáveis para viabilizar a sua significativa ampliação, o que certamente não ocorrerá caso se permita ao governo que continue interferindo nas propostas orçamentárias apresentadas pelo Defensor Público-Geral Federal”, destaca o jurista.
Nessa matéria, aliás, os defensores-gerais dos Estados também desfrutam da mesma iniciativa privativa, no plano do processo legislativo estadual. Portanto, pode-se afirmar que “o Defensor Público-Geral Federal detém iniciativa privativa para leis que disponham sobre a organização da Defensoria Pública da União, que estabeleçam normas gerais para a organização da Defensoria Pública dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios, e que visem à alteração do número de membros da Defensoria Pública da União, criação e extinção dos seus cargos, a remuneração dos Defensores Públicos Federais e dos servidores da instituição”, explica o documento.