Há dez anos, a Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro criou uma coordenação pioneira para enfrentar, de forma mais estratégica e sensível, os desafios relacionados ao acesso à saúde pública: nascia a Coordenadoria de Saúde COSAU. Surgindo em 2015 como resposta à sobrecarga de ações judiciais na área da saúde — à época, a DPRJ era responsável por cerca de 70% do acervo de processos em trâmite no Tribunal de Justiça do RJ. Mais do que um novo setor, a COSAU marcou o início de uma virada institucional, baseada em diálogo, articulação com o SUS e soluções extrajudiciais que colocassem a vida e a dignidade no centro da atuação jurídica.
Esse novo modelo foi guiado por um projeto estratégico que segue vivo até hoje: "Construindo o SUS com a Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro". A iniciativa foi elaborada a partir da experiência acumulada por defensoras e defensores que já atuavam na área. Dividido em cinco eixos, o projeto articula desde ações de resolução extrajudicial até a promoção de cidadania sanitária, integrando as dimensões individual e coletiva do direito à saúde.
Para a defensora pública Luiza Maciel, subcoordenadora de saúde e tutela coletiva, o processo de atuação na coordenação é desafiador, devido a complexidade da atuação de saúde pública no Brasil.
— É uma experiência muito desafiadora, pois a coordenação tem muitas atribuições, tanto junto aos colegas da Tutela Individual quanto no exercício da Tutela Coletiva, mas, ao mesmo tempo, tem sido uma experiência muito gratificante porque a área da saúde é uma área muito sensível, especialmente no Brasil — afirmou a defensora.
Entre os principais marcos dessa trajetória estão as Caravanas do Direito à Saúde, realizadas em diversas regiões do estado entre 2015 e 2024. As ações, que envolvem escuta da população, articulação com gestores locais e coleta de dados sobre redes de atenção, se tornaram fundamentais para interiorizar o modelo de atuação que nasceu na capital e para consolidar a atuação coletiva da Defensoria.
Dez anos de escuta, articulação e transformação
Além dos números, a COSAU se consolidou como um espaço humano de escuta ativa, articulação institucional e aprendizado coletivo. Sua atuação hoje abrange temas como saúde mental, mortalidade materna, saúde da população trans, pessoas com deficiência e população privada de liberdade. Também estabeleceu parcerias importantes com entidades de saúde e universidades, construindo pontes entre o jurídico, o técnico e o social.
Atualmente, a coordenação é liderada pelo Defensor Público Fábio Schwartz e pelas subcoordenadoras Luiza Maciel, e Renata Pinheiro.
— Assumir a Coordenadoria de Saúde e Tutela Coletiva foi como aceitar um chamado para enfrentar, diariamente, as fronteiras mais sensíveis da dignidade humana. A saúde é, muitas vezes, a última esperança de quem já perdeu tudo — e nosso trabalho é garantir que essa esperança se transforme em ação concreta de transformação social. — afirma o Defensor Fábio Schwartz.
Sobre os desafios atuais e a dinâmica de equipe, o Defensor completa:
— Desde que estou à frente da coordenadoria, enfrentamos desafios imensos: da escassez de medicamentos essenciais à demora em cirurgias emergenciais. Mas também vivenciamos avanços marcantes. Conseguimos estruturar melhor o fluxo de atendimento, fortalecemos o diálogo com os órgãos públicos e ampliamos as ações coletivas, que beneficiam milhares de pessoas ao mesmo tempo. Porém, nada disso seria possível sem uma equipe comprometida, em especial, minhas subcoordenadoras, Luiza e Renata, e sem o olhar atento às desigualdades que marcam o acesso à saúde no nosso país. Todos os dias, temos que reafirmar que a saúde não é favor, é direito —
Ao completar dez anos, a COSAU segue firme em sua missão: promover uma defensoria resolutiva, acolhedora e profundamente conectada à realidade da população fluminense. O futuro prevê a ampliação da equipe técnica, o fortalecimento das estratégias extrajudiciais e o monitoramento contínuo das políticas públicas. Mais do que celebrar uma década de existência, este é um momento de reafirmar um compromisso: o de seguir construindo, coletivamente, um SUS mais justo e acessível para todas as pessoas.
— É um trabalho de monitoramento constante, escuta, aprendizado e, claro, muita luta. A prestação de um adequado e eficiente serviço público de saúde à população é o grande objetivo para nós, seja no âmbito coletivo, seja no auxílio ao defensor que está na ponta, responsável por aquele caso individualizado. Não há nada mais motivador. Ver o potencial de um trabalho muitas vezes de bastidor gerar mudanças sistêmicas e beneficiar um grande número de pessoas é, sem dúvidas, a parte mais recompensadora da minha função — afirmou a Defensora e subcoordenadora Renata Pinheiro.
Em 2025, a atuação se volta ao fortalecimento dos vínculos com os municípios do interior, com o objetivo de aumentar a defesa dos direitos coletivos, sobretudo nas áreas de saúde e assistência social. A primeira reunião com os Núcleos Regionais de Tutela Coletiva, no começo do ano, marcou o início deste novo ciclo, trazendo à pauta temas urgentes como os planos de contingência municipais para chuvas, o combate às arboviroses e a necessidade de expansão da rede de atenção psicossocial nos territórios.
—Trabalhar com saúde é lidar com urgência, com humanidade exposta. E o que nos move é isso: a possibilidade real de fazer diferença, não só com técnica jurídica, mas sempre com empatia e compromisso com a luta pela dignidade dos mais vulneráveis.— finalizou o Defensor Fábio Schwartz.