Movimentos sociais reforçam necessidade da presença de defensores nas manifestações populares
Estado: DF
Representantes de movimentos da sociedade civil organizada, reunidos na manhã de hoje (7), durante o primeiro turno da Assembleia Geral da ANADEP, promovida em parceria com o Fórum Justiça, na Faculdade de Direito da UnB, em Brasília, reforçaram a importância da presença de defensores públicos nas manifestações populares. Manifestaram-se, ainda, no sentido de que é necessária a busca de soluções coletivas, reconhecendo o número reduzido de agentes no país e a estrutura deficitária da Defensoria no Brasil. O encontro, que contou com a presença de defensores de diversas regiões do país, representantes do Governo Federal, judiciário, Ministério Público Federal, organizações voltadas à garantia dos direitos humanos, entre outros, prossegue à tarde, e encerra com a retirada de uma orientação conjunta para atuação unificada dos defensores em todo o territorio nacional, frente às manifestações populares que se avizinham, com a proximidade dos jogos da copa.
Ao abrir os trabalhos, integrante do Forum Justiça, Rosane Lavigne destacou o momento pelo qual passa a Defensoria Pública. "É um desafio contemporãneo para a Defensoria, a incorporação de práticas de participação popular. Este encontro, vejo como muito significante, porque estabelece um marco para a caminhada de consolidação da Instituição como instrumento de defesa de uma maneira permanente, sistemática e contínua de participação popular", registrou.
Em sua fala na abertura, a presidente da ANADEP, Patrícia Kettermann, agradeceu a presença de todos. “Esta escuta, esta troca democrática é essencial para a Defensoria Pública. Nossa meta é cada vez mais fazer com e não fazer para. Queremos ouvir o que os atores da sociedade esperam da Instituição, para podermos efetivamente garantir aquilo que a sociedade brasileira espera”, pontuou.
O diretor e ex-presidente da Associação, André Castro, coordenou a primeira roda de debates, voltada à escuta dos movimentos sociais, convidando a todos, inicialmente, a responder um questionário com as principais preocupações e dilemas com relação às manifestações populares, além de intermediar os diálogos. Um dos primeiros a fazer uso da palavra foi o representante da rede Observatório das Metrópoles, Rômulo Ribeiro. O organismo tem uma pesquisa em rede específica com relação à copa e seu impacto nas cidades-sede, basicamente contemplando quatro eixos: segurança, moradia e mobilidade meio ambiente e governança. “O que se percebe é a desinformação sobre as ações a serem tomadas, justamente para desmobilizar a articulação popular. Há um processo de mercantilização e elitização das cidades. E o que chama a atenção sobre a copa já começa pelo nome. É um evento da Fifa, e não do povo, temos percebido isso, inclusive pelo nome”, afirmou.
ATUAÇÃO POSITIVA
Defensores públicos do Distrito Federal trouxeram o exemplo da atuação da categoria em Brasília, durante as últimas manifestações, criando uma cartilha com os direitos do manifestantes, indo ao centro de movimento. “É um desejo nosso de comunicar com o Estado, e surgiu a ideia de criarmos um grupo na associação, e elaboramos esta cartilha, disponibilizando um telefone, para que soubéssemos as dificuldades dos palestrantes Foi uma experiencia muito rica, tivemos relatos importantes, de como era a relação dos manifestantes com a polícia, e isso abriu um espaço importante, conseguimos evitar atritos importantes”, relatou o defensor Alexandre Braúna.
O juiz de direito, membro da Associação Juizes para a Democracia, Rubens Casara, classificou os movimentos sociais da forma como foram desencadeados um fenômeno novo, ao qual todas as instituições estão se adequando. E pontuou a diferença entre multidão e massa. “O que caracteriza multidão é o desejo de democracia. Manifestações marcadas com o desejo de democracia. E qual seria o papel da Defensoria participando dessas manifestações? Fazer uma mediação com as instituições. Me assusta um pouco a Defensoria participando unicamente na repsonsabilização daqueles que atuam contra a liberdade. Acho que a Defensoria é das instituições de estado a única que tem o perfil de alimentar a discussão entre instituições”, ponderou.
Ana Virginia Ferreira, presidente do colégio de ouvidorias das Defensorias Públicas, tem uma visão distinta com relação ao ineditismo dos movimentos. “Dentro deste cenário penso que o papel da Defensoria deve ser atuar pela garantia dos direitos, não apenas na garantia da justiça, mas direitos sociais e direitos políticos. Essas manifestações acontecem justamente porque esses direitos estão sendo negados. Discordo que seja um fenomeno novo; os movimentos sociais tem um historico de atuação. Dizer que isso é um fenomeno novo é negar o papel historico dos movimentos. Infelizmente esses movimentos não tiveram o direcionamento das manifestações de massa”, completou. Ela aponta ainda a necessidade de uma maior compreensão dos Defenosres Públicos com relação a sua atuação social. “Seria importante a sensibilização dos defensores como um todo. Há os que lutam e há os que não estão dando a devida importancia, sem atuar como agente político, estão ali apenas para fazer seu trabalho e voltar para sua casa. Seria ideal a sensibilização dos defensores como um todo. A Defensoria poderia ser vanguardista neste sentido”, finalizou.
GOVERNO E MOVIMENTOS SOCIAIS
Representante do governo federal no encontro, o secretário para Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça, Marivaldo Pereira, falou um pouco sobre a visão do Executivo sobre as mobilizações. Destacou a criação de um protocolo padrão de atuação das polícias, prevendo o uso proporcional da força, obrigatoriedade de identificação, diálogo para solução de conflitos. Também enfatizou a necessidade de haver uma previsão de linhas de atuação da polícia. “Precisamos prever os dois lados. Proteção à atuação de jornalistas e advogados. Para, se acaso criarmos algo, que isso que não vá pelo caminho da mera tipificação de terrorismo. O MJ tem que atuar no sentido de garantir a segurança em grandes eventos. Ao governo se atribui todos os males e violências cometidas nas manifestações”, relatou, garantindo que o único ponto possível de avaliação, por parte do governo, dos 17 projetos que foram apresentados com relação às manifestações populares, se refere ao crime de dano.
Pareira propôs ainda uma reflexão tambem sobre a afirmação de que a copa retiraria dinheiro da saúde e educação. “Esses recursos vem aumentando, sem qualquer interrupção”, disse. Afirmaçào à qual Larissa da Silva Araújo, representante do Comitê Popular da Copa no DF, estabeleceu um contraponto. “Quando o secretário diz que não houve desvio de dinheiro da saúde e educação isso é metafórico. Porque indiretamente sim. Quando não há orçamento para combate de violações ao direito de crianças e adolescentes durante a copa temos um exemplo disso. É importante, portanto, o posicionamento da Defensoria, que é um dos mais contundentes canais de interlocução com a esfera pública, um dos principais canais com a institucionalidade”, definiu.
Confira a seguir algumas de outras importantes falas registradas ainda durante a manhã:
Marcelo Semer – Magistrado integrantes da Associação Juizes para a Democracia
“A Defensoria Pública tem um caráter anfíbio: atua como importante instrumento do sistema de justiça, mas também tem um papel fundamental no diálogo com a sociedade civil. A Defensoria é do povo. Em relação à manifestação popular, acho que o defensor tem que estar presente, pois ele será essencial na proteção à vítima; para diminuir e coibir a violência policial.”
Eduardo Cavalieri – Defensor público, presidente da ADEP/MG
“Me preocupa quando se fala nesta questão de que a defensoria Pública precisa se apropriar de bandeiras, porque nossa bandeira deve e precisa ser o empoderamento da sociedade civil organizada. Estar presente nas manifestações populares para garantir o direito a voz do cidadão, esta deve ser a nossa bandeira. Se adotarmos qualquer outra, perdemos o posto de mediadores”.
Adriano Campos – Defensor público Maranhão
“Só com a presença da Defensoria já há uma modificação da conduta policial. A presença pura e simples, não estavam lá institucionalmente. As defensorias presentes nas manifestações ostensivamente como forma de coibir de imediato, Não no sentido de responsabilizar criminalmente, mas no sentido de servir como um colchão, de amortecer, frear este impacto. A grade solução que a DP traz para os problemas sociais no Brasil é a educação em direitos. Essas manifestações foram quase instintivas, quase como um empurrão. As manifestações estão vindo, e virão de uma forma avassaladora. E se a DP não se organizar podemos ter aí um recrudescimento, algo mais violento.”
Erika Lula de Medeiros – Terra de Direitos
“Seria importante que os defensores procurassem os grupos com pautas já definidas. Um pouco da demanda das cidades sedes pode vir destes grupos.”
Arilson Malaquias - Defensor público, presidente da APIDEP
“Precisamos ter o cuidado para uso da linguagem para não retirar os defensores do papel de intermediação e interlocução junto ao Estado. Devemos trabalhar também no sentido preventivo no sentido de minimizar os exageros, de ambas as partes, inclusive. Dialogar com os movimentos e também como Estado, de como enfrentar esta questão. Próximo que é dos movimentos sociais, o papel da defensoria é de colaborar para que haja repsostas positivas à sociedade.”
Antonio Escrivão – Articulação Justiça e Direitos Humanos
“O Recrudescimento aumenta a necessidade da Defensoria Pública e da advocacia. Acontece que nestas posições de diálogo e atuação conjunta vimos um processo de criminalização dos advogados populares. Está sendo fomentado um plebiscito popular por uma nova Constituinte, coisa que os juristas tem muita dificuldade de lidar. Mas a questão é fazer o debate. Um plebiscito puxado pelo s movimentos sociais populares, centrais sindicais e partidos de esquerda. Convido a todos a abrir os olhos e não ceder à primeira perspectiva jurídica de negar o tema.”