Flávia Albaine - Coordenadora da Comissão dos Direitos das Pessoas com Deficiência da ANADEP
As pessoas com deficiência fazem parte de um grupo de pessoas em situação de vulnerabilidade, eis que possuem um histórico de exclusão e violência sistemáticos. Por sua vez, a Defensoria Pública é Instituição que se configura enquanto instrumento do regime democrático e promovedora dos direitos humanos. Uma sociedade se torna democrática na medida em que o sistema jurídico está comprometido com a proteção das liberdades individuais, com os direitos sociais e com as práticas inclusivas. Portanto, é inegável a importância da atuação da Instituição direcionada para a inclusão social de pessoas com deficiência.
O modelo social de deficiência, em vigor tanto em âmbito interno assim como em âmbito internacional, surge em superação ao modelo médico reabilitador. A deficiência passa a ser vista como a resultante da interação entre as características individuais do sujeito mais as barreiras existentes na sociedade que ele está inserido e que atrapalham ou impedem o gozo de seus direitos e deveres com o maior grau de autonomia possível. É o contexto social que gera a exclusão e a solução da situação passa por uma sociedade acessível para todos os seus membros.
Sendo assim, diante das barreiras experienciadas por pessoas com deficiência, a Defensoria Pública atua para a proteção desse grupo de pessoas sempre que restar configurada uma hipótese de vulnerabilidade, independentemente da respectiva situação financeira da pessoa interessada. A Instituição atua no combate ao capacitismo e todas as suas formas de expressão.
Analisando o artigo 4º, inciso XI da LC 80 de 1994 - que menciona expressamente a atuação da Defensoria Pública em favor das pessoas com deficiência e de outros grupos vulneráveis - é possível concluir que a Defensoria Pública funciona como instrumento de superação da violência, da intolerância, da discriminação, da exclusão social e da incapacidade geral de aceitar o diferente. Por que razão, nessas hipóteses a atuação da Defensoria Pública não está relacionada à hipossuficiência econômica. Em eventual ação individual de pessoa com deficiência cujo objeto esteja relacionado com a deficiência, o resultado poderá abrir portas para outras pessoas com deficiência, ao menos por conta da criação de um precedente. Ainda que a lide seja individual, ela refere-se a um problema comum de determinado grupo vulnerável, podendo trazer benefícios - de maneira global - para tal grupo.
No tocante à atuação da Defensoria Pública como custos vulnerabilis em favor da pessoa com deficiência, o embasamento jurídico encontra previsão no artigo 79, parágrafo 3º e artigo 98, ambos da Lei Brasileira de Inclusão, que preveem que a Defensoria Pública tomará as medidas necessárias para a efetivação dos direitos das pessoas com deficiência previstos na referida lei, assim como poderá ingressar com demandas judiciais para a proteção de interesses coletivos, difusos, individuais homogêneos e individuais indisponíveis da pessoa com deficiência. Desta feita, em casos judiciais e extrajudiciais que envolvam temas que tragam grandes reflexos a pessoas com deficiência, faz-se indispensável a intervenção institucional da Defensoria Pública na condição de custos vulnerabilis para fiscalizar a efetivação dos direitos constitucionais de tal grupo, uma vez que eventual decisão processual ou extraprocessual poderá gerar profundo impacto na vida de tais indivíduos.
Desta feita, Defensoras e Defensores Públicos atuam diariamente na efetivação dos direitos das pessoas com deficiência, seja em âmbito coletivo ou individual, na seara administrativa ou judicial. A Defensoria Pública é, indiscutivelmente, uma Instituição de instrumentalização do modelo social de deficiência e todos os seus colorários pela implementação de uma sociedade menos capacitista e mais inclusiva.